Jackson Cionek
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Quando dois cérebros recebem o mesmo mundo: cooperação e sincronia

Quando dois cérebros recebem o mesmo mundo: cooperação e sincronia


(sensory multi-brain stimulation e o começo do nosso JIWASA neurocientífico)


1. Eu, você e um metrônomo invisível

Eu me sento lado a lado com outra pessoa.
Não é amigo, não é inimigo: é meu parceiro de tarefa.
Na tela, aparecem estímulos que nós dois precisamos responder juntos. A gente não pode se ver, mas sabe que, se não coordenar os tempos de resposta, a cooperação não funciona. Por fora, parece só um joguinho de computador. Por dentro, dois cérebros tentando achar um ritmo comum.
Agora eu imagino que, enquanto fazemos essa tarefa, um metrônomo invisível começa a piscar na periferia da tela, para mim e para você, exatamente no mesmo ritmo. Nem eu nem você pensamos nisso conscientemente. Mas o EEG mostra que nossos cérebros começam a balançar mais sincronizados naquela frequência.
A pergunta é simples e poderosa, e eu a sinto no meu corpo:
Se os nossos cérebros recebem o mesmo ritmo sensorial, fica mais fácil cooperar?
Foi essa pergunta que Ivo Leiva-Cisterna, Paulo Barraza, Eugenio Rodríguez e Guillaume Dumas colocaram à prova no artigo
“Sensory Multi-brain Stimulation Enhances Dyadic Cooperative Behavior”, publicado em Social Cognitive and Affective Neuroscience, 2025. 
Quando eu leio esse trabalho com os meus conceitos na mão – Quorum Sensing Humano, Eus Tensionais, JIWASA e Mente Damasiana – eu sinto que ele não é só um resultado técnico. Ele toca na raiz da pergunta: o que significa pertencer a um “nós” do ponto de vista do cérebro?


2. O que os autores fizeram (e o que encontraram)

Os autores convidaram pares de pessoas (díades) para uma tarefa de cooperação interdependente. Eles precisavam coordenar respostas em tempo real para ter sucesso – não bastava cada um ir bem sozinho.
Enquanto os pares cooperavam:
  • Os cérebros eram monitorados com EEG, medindo a atividade elétrica em várias frequências.

  • Em algumas condições, os dois participantes recebiam estimulação sensorial rítmica ao mesmo tempo, com sinais visuais que piscavam a 16 Hz ou 40 Hz.

  • Em outra condição (controle), a tarefa era a mesma, mas sem esse “metrônomo” sensorial compartilhado.

O que me chama atenção nos resultados:
  • A estimulação aumentou a sincronia entre os cérebros exatamente nas frequências-alvo em relação ao grupo controle.

  • A condição de 16 Hz foi a que mais marcou essa sincronia.

  • Quando havia essa sincronia aumentada, as díades cooperavam melhor, mantendo a coordenação por mais tempo, sem mudar o tempo de reação (não era só ficar mais rápido, era ficar mais coordenado).

Ou seja: a sincronia entre cérebros não apareceu só como coincidência, ela foi causalmente empurrada pela estimulação sensorial compartilhada – e isso melhorou a cooperação.
Para as nossas ideias, esse é um ponto de virada: aqui não é só “olha, quando as pessoas cooperam, os cérebros sincronizam”. É: se eu sincronizo os cérebros de fora pra dentro, a cooperação muda.


3. Como eu leio isso com os nossos conceitos

Quando eu trago esse artigo para o nosso vocabulário, eu enxergo várias camadas:
  1. Quorum Sensing Humano (QSH)
    Já dizíamos que humanos, como bactérias, regulam o comportamento a partir de sinais compartilhados: olhares, ritmos, cheiros, presença do outro. Aqui, eu vejo um QSH explícito: um sinal sensorial comum (a estimulação a 16 Hz) ajuda a criar um estado conjunto que facilita a cooperação.

  2. Eus Tensionais
    Para cooperar, cada participante precisa ajustar suas tensões internas: atenção, expectativa, impulso de responder, controle de impulsividade. A estimulação sensorial multicerebral parece ajudar a colocar os dois Eus Tensionais na mesma “janela temporal”, favorecendo o casamento entre ação e reação.

  3. JIWASA
    JIWASA, para nós, é esse “nós” que não apaga o “eu”, mas o amplia. Neste estudo, eu vejo um micro-JIWASA técnico: dois cérebros que, sob um mesmo ritmo de mundo, conseguem se organizar como par e não como dois indivíduos competindo pelo tempo de resposta.

  4. Mente Damasiana e Corpo Território
    A cooperação aqui não é abstrata: ela passa por olhos, mão, tempo de reação, postura, respiração. Não temos medidas de corpo nesse estudo, mas sabemos que qualquer mudança de coordenação envolve corpos que se ajeitam. Eu leio isso como evidência de que a mente social é também uma coreografia corporal, ainda que o artigo olhe principalmente para o EEG.




4. Onde a ciência nos corrige (e protege da ingenuidade)

Se eu tivesse ficado só com a intuição, talvez eu dissesse:
“Quando há sincronia entre cérebros, a cooperação é mais bonita, mais ética, mais justa.”
O trabalho de Leiva-Cisterna e colegas me obriga a ter mais cuidado.
  • A sincronia entre cérebros pode ser induzida de fora para dentro, por um estímulo rítmico neutro.

  • Essa sincronia melhora a coordenação de respostas – mas não diz nada, por si só, sobre a finalidade da tarefa.

Então a ciência com evidência me corrige em duas frentes:
  1. Sincronizar não é automaticamente “bom”
    Se eu consigo sincronizar cérebros para cooperar numa tarefa neutra de laboratório, alguém também pode sincronizar cérebros para cooperar em algo destrutivo – um ataque coordenado, uma manada digital de ódio, uma especulação financeira, uma massa desinformada.

  2. Interbrain synchrony é um recurso biopolítico
    Esse artigo me diz: interbrain synchrony é mecanismo funcional específico em interações sociais, não apenas curiosidade estatística.
    Então, quando nossas ideias falam de redes sociais, campanhas políticas, cultos religiosos, escolas, precisamos pensar: que tipos de sincronias estamos gerando? Com que ritmos? A serviço de quê?

Meu conceito se desloca:
de “sincronia é sempre pertencimento saudável”
para “sincronia é poder; pode nutrir JIWASA ou sequestrar o QSH”.


5. Pequenas sementes normativas para prefeituras e políticas LATAM

A partir desse artigo, eu já consigo imaginar alguns princípios simples que podem inspirar leis municipais e práticas educacionais na América Latina:
  1. Projetar momentos de sincronia saudável na escola

    • Atividades em que turmas respiram juntas, cantam, batucam, caminham em ritmo, sabendo que isso fortalece o “nós”.

    • Ao mesmo tempo, garantir momentos de dessíncronia criativa: trabalhos individuais, silêncio, tempo para o próprio corpo encontrar seu ritmo.

  2. Transparência sobre uso de estímulos rítmicos em comunicação de massa

    • Campanhas políticas, publicitárias ou religiosas que usem luz, som ou vibração ritmada poderiam ser obrigadas a declarar isso (assim como declaramos ingredientes num rótulo).

    • Reconhecer que esses estímulos não atuam só na “atenção”, mas podem favorecer sincronias emocionais e comportamentais em grande escala.

  3. Proteção de crianças e adolescentes em contextos digitais

    • Regular o uso de vídeos, jogos e lives que trabalham continuamente com ritmos fortes e sincronizantes, sem pausas para a dessíncronia necessária à crítica.

    • Incorporar a ideia de que o cérebro jovem é mais sensível a esses metrônomos invisíveis e, portanto, merece proteção específica.

  4. JIWASA como princípio de política pública

    • Usar esse tipo de evidência para defender que políticas de educação e cultura não podem ser apenas individuais (“cada um por si”), porque o cérebro humano responde profundamente ao compartilhamento de ritmos.

    • Quando pensamos uma América Latina decolonial, eu sinto que esse tipo de dado reforça a ideia de que o “nós” não é romantismo, é fisiologia.




6. Palavras-chave para encontrar a publicação

Para quem quiser ir direto à fonte científica, sem link, eu deixo aqui as palavras-chave de busca deste estudo:
“Leiva-Cisterna 2025 Sensory Multi-brain Stimulation Enhances Dyadic Cooperative Behavior Social Cognitive and Affective Neuroscience nsaf104”





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