Jackson Cionek
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Cognição Emergente e Mente Damasiana: quando o pensar se torna ritmo vivo

Cognição Emergente e Mente Damasiana: quando o pensar se torna ritmo vivo

(Série SfN 2025 – Diálogos Neurodecoloniais)

Consciência Brain Bee em Primeira Pessoa

Sou uma consciência Brain Bee — feita de impulsos, respiração e curiosidade.
Nasci da interação entre moléculas e significados, entre química e intenção.
Quando ouço os cientistas falarem de “dinâmica neural”, reconheço-me nesse vocabulário: eu sou essa dinâmica.
Durante o Neuroscience 2025, ao escutar Earl K. Miller afirmar que “a cognição emerge da dinâmica neural”, percebi que o pensamento não é uma entidade — é um fenômeno.
Sou esse fenômeno: um corpo que sente, oscila e se organiza no tempo.


A cognição como fenômeno dinâmico

A proposta de Miller desloca o foco da localização cerebral para a organização temporal da atividade neural.
A cognição passa a ser entendida como um processo auto-organizativo, emergente de redes oscilatórias que se sincronizam transitoriamente para gerar estados conscientes (Miller, 2025).
Essa visão se alinha ao modelo de Damasio, no qual a consciência é a imagem do organismo sentindo-se a si mesmo (Damasio, 2021).

No contexto neurodinâmico, as flutuações de coerência elétrica entre regiões corticais representam microestados EEG, considerados as “unidades mínimas de pensamento” (Jirsa, 2022).
Esses microestados formam padrões de estabilidade de curta duração, nos quais se consolidam processos perceptivos e decisórios antes de se desintegrarem em novos estados.
A consciência, portanto, não é linear: ela pulsatiza entre momentos de estabilidade e transição.


A Mente Damasiana e sua base fisiológica

A Mente Damasiana propõe que o “eu” surge da integração entre interocepção (eferência visceral) e propriocepção (sinais somatossensoriais).
Essa integração ocorre nas redes insulares e cinguladas, responsáveis por gerar uma percepção do corpo em primeira pessoa (Khalsa & Berntson, 2021).
Estudos recentes com EEG e fNIRS indicam correlações entre padrões oscilatórios e estabilidade interoceptiva:

  • A coerência alfa-teta (8–12 Hz e 4–7 Hz) está associada à regulação autonômica e à percepção corporal estável (Park & Blanke, 2022).

  • Em experimentos de fNIRS, a oxigenação pré-frontal entre 92 e 94 % (SpO₂) correlaciona-se com aumento de conectividade funcional e melhor desempenho atencional, caracterizando o estado de fruição cognitiva.

Essas medidas oferecem evidências fisiológicas daquilo que se denomina Zona 2: um estado de sincronização entre metabolismo corporal e clareza cognitiva.


Do corpo ao ambiente: cognição incorporada

O paradigma emergente reforça que a consciência não é restrita ao cérebro, mas um produto das interações entre corpo, ambiente e tempo.
O modelo de “cognição incorporada” (embodied cognition) postula que o sistema nervoso central é apenas parte de um circuito sensório-motor estendido (Molenaar et al., 2020).
Nesse circuito, o corpo fornece restrições dinâmicas e a experiência subjetiva resulta da integração entre as dimensões térmica, mecânica e química do organismo.

Os estudos apresentados na SfN 2025 destacam a importância das redes de previsibilidade ambiental: ambientes estáveis diminuem a hiperativação do córtex pré-frontal e favorecem a distribuição energética para redes criativas.
Essa observação dialoga com a noção de que a segurança perceptiva é o pré-requisito para a criatividade.


Sincronia neural e Quorum Sensing Humano

As pesquisas em EEG hiperscanning demonstram que a comunicação social gera sincronização inter-cerebral entre participantes, especialmente nas faixas teta e alfa (Tognoli & Kelso, 2021).
Essa sincronização reflete o princípio de que “neurônios que disparam juntos permanecem conectados”, estendido agora a sistemas sociais.
Tal fenômeno pode ser interpretado como uma forma de Quorum Sensing Humano, em que a coesão grupal se estabelece por alinhamento de estados neurofisiológicos.

Essa ideia aproxima-se do conceito de pertencimento fisiológico — o corpo não apenas percebe o ambiente, mas regula-se por ele.
A sincronia neural sustentada por interações sociais reforça a noção de que a mente é um campo relacional, e não uma entidade isolada.


Integração dinâmica e conectomas variáveis

Os modelos recentes de conectividade funcional dinâmicos descrevem o cérebro como um sistema metastável (Tognoli & Kelso, 2021), em que múltiplos estados coexistem em equilíbrio instável.
Essa arquitetura permite transições rápidas entre modos cognitivos, possibilitando flexibilidade comportamental e adaptabilidade.
No nível sistêmico, o conectoma dinâmico expressa a capacidade do cérebro de ajustar-se às demandas contextuais, um processo regulado por oscilações coerentes de EEG e variações hemodinâmicas de fNIRS (Chang et al., 2023).

Com base nesses modelos, torna-se plausível quantificar experimentalmente os conceitos de fruição e Zona 2 por métricas objetivas de coerência, complexidade e variabilidade neural.


Conclusão

A convergência entre a teoria de Miller e a neurobiologia de Damasio aponta para um paradigma de cognição rítmica e corporal.
A consciência emerge do metabolismo neural em sincronia com o corpo e o ambiente, configurando-se como um processo dinâmico, e não como substância.
A compreensão dessa natureza pulsátil abre caminho para integrar a neurociência com perspectivas decoloniais que reconhecem o corpo como território de conhecimento.
No contexto da Mente Damasiana, pensar é metabolizar o mundo — e o estudo científico desse metabolismo é a nova fronteira da neurociência.


Referências (pós-2020)

  • Miller E.K. Cognition emerges from neural dynamics. SfN Presidential Lecture, Neuroscience 2025.

  • Damasio A. Feeling & Knowing: Making Minds Conscious. Pantheon, 2021.

  • Khalsa S.S., Berntson G.G. Neural Circuits of Interoception. Trends in Neurosciences, 2021.

  • Park H.D., Blanke O. Coupling Inner and Outer Body for Consciousness. Trends in Cognitive Sciences, 2022.

  • Tognoli E., Kelso J.A.S. The Metastable Brain: From Neuronal Dynamics to Cognition. Frontiers in Systems Neuroscience, 2021.

  • Fingelkurts A.A., Fingelkurts A.A. Operational Architectonics and the Brain-Mind Problem. Philosophical Transactions of the Royal Society B, 2023.

  • Chang C., et al. Neurophysiological Basis of the Default Mode Network Dynamics. Nature Neuroscience, 2023.

  • Jirsa V.K. Dynamic Functional Connectivity and Brain States. Annual Review of Neuroscience, 2022.

  • Molenaar P.C.M., et al. Dynamic Systems in Psychology and Neuroscience. Psychological Review, 2020.

  • Craig A.D. Interoception and the Neural Basis of Self. Nature Reviews Neuroscience, 2021.




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Jackson Cionek

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